quarta-feira, dezembro 17

VOLTA DAS SERRAS: Petropólis, Itaipava, Terê, Friburgo


Aventura inesquecível, minha primeira cicloviagem (de muitas espero) e vou explicar por quê.

As subidas em especial me dão PÂNICO. Não sei ainda o motivo, talvez Freud explique. Mas o fato é que fiquei muito nervosa a semana inteira só de pensar nesta viagem, que seria um desafio especial para mim. O joelho machucado (os dois doendo, mas o esquerdo estava de matar...) me deixou ainda mais insegura.

Crianças, não tentem fazer isso em casa: tomei remedinhoso (drogas pesaaaaadas) a semana inteira só pra poder ir na viagem. Ihhh, nem adianta falar, não vou ouvir: “não faça isso, etc etc etc”, sou taurina e teimosa igual à peste.

Mas enfim, na véspera à noite descobri que todos iam de pneu biscoito (e só eu de slick), que meu pneu tava arriado e que havia perdido meu ciclo. Fiquei mais insegura ainda!!! Conclusão: no sábado eu tava um pilha, à beira de um ataque de nervos, achando que não a chegar nem a Petrópolis...

Encontrar a galera foi um alívio. As palhaçadas do trem, com direito ao "coraçãozinho" do Emilio, a pole dance do Edison, as fotos tresloucadas do Bob Pai e a ansiedade pela conchinha da noite (piada interna!) foram me deixando menos nervosa.

Tivemos que amarrar as bikes no trem, pois a cada freada elas iam longe!!! A Central do Brasil foi uma aventura: éramos olhados como ETs querendo fazer contato, e assim foi durante todo o finde, por onde passávamos.

Chegando a Saracuruna, dúvidas quanto ao percurso. Fomos "saudados" por uma senhorinha simples e extremamente simpática, que falou que "aquela criança" (eeeeuuu!!!!) não ia conseguir chegar a Friburgo não!!!

Depois, em Raiz da Serra, mais um "vidente", no boteco que paramos, falou também que "aquela senhora", apontando pra Denise, não ia agüentar subir não... Há, mal sabia ele. Rimos todos da sua cara e ele não entendeu bulhufas.

A subida começou, paralelepípedos intermináveis. Com parada pra banana em frente a um terreiro. Vencida esta parte do trajeto, já veio um certo alívio: passada a temida Serra Velha de Petrópolis, que eu tava demonizando, e depois vi que não era nada demais...

Bem, parada pra almoço (mais um lanche do que almoço) em Petrópolis e fomos pra Itaipava. Lá, Carmelo se despediu. Pena. Ficamos preocupados com sua volta, que depois sabemos que teve alguns percalços. Paramos no shopping Vilarejo para comprar água, banheiro e ver loja de bike. A essa altura eu mal conseguia andar!!! Pra pedalar não tanto, mas pra andar... eu me arrastava, o joelho doía MUUUITO.

E aí veio a serra de Terê. O pessoal começou a imprimir um ritmo que eu achei que não ia conseguir acompanhar, e o joelho doíiiiia. Fiquei MEGA nervosa. Pensei: já era, vou ficar por aqui, tudo perdido. Roger ia no final fazendo a escolta e dando uns toques... me orientando com as marchas e o giro. Mal sabia ele, tadinho (Roger, valeeeeu pela força, viu? não repara no que vou dizer não!!!) que me deixou mais nervosa ainda! Fiquei com medo de ficar pra trás, de não conseguir acompanhar o grupo.

E depois só lembro de subir subir subir. Só subidas. Nunca que o raio do topo chegava. E eu pensando: vão ser 30km de subidas, eu mal agüento subir a Vista Chinesa, já era.

Bem, fica aí a lição: psicológico é tuuuuudo. Quando sua cabeça vai mal, não consegue nem pedalar direito! Foi isso que aconteceu comigo: apesar de eu não estar 100% fisicamente, o que mais pesou foi a cuca.

E foi anoitecendo. E foi esfriando. E estávamos encharcados. E nada de parar de subir. E nada de chegar o topo. E no meio daquele breu, de repente me senti sufocando: um bolo na garganta não me deixava respirar... E fiquei entalada. Virei pro Emílio e falei: preciso parar.

Não havia a mínima luz, não conseguíamos enxergar nada a frente, não passava um carro pra iluminar o caminho, só mato, névoa, frio e chuva. Paramos, pois eu já devia estar roxa de sufocada. E cansada, muito cansada. E pensando: não vou conseguir, não agüento mais subir nada... Não sei quanto falta, ninguém sabia, pois não dava pra ver!!! E aí me desesperei: entrei em prantos, soluçava, lágrimas aos borbotões. Botei pra fora todo o choro que estava engasgado desde manhã cedo. E aí voltei a respirar...

E o grupo a minha volta. Não precisavam falar muito, nem falaram... bastava estarem ali comigo. Às vezes o silêncio diz mais que mil palavras, certo?

O frio foi batendo, a fome tava negra e começamos a buscar o que cada um tinha pra comer. Abrimos biscoito, um pacote de tacos borrachudos que devoramos com sal que a Denise providencialmente levara. E nos animamos a continuar.

Pareceu bruxaria: voltamos a pedalar e a subida ACABOU!!! Havíamos chegado ao topo da serra. E começamos a descer. Nem acreditamos. Aí foi a vez da Rê se emocionar e deixar as lágrimas rolarem. Peço licença ao amigo Emílio pra reproduzir algumas palavras dele sobre esses momentos:

"No topo da montanha e naquela escuridão infinita... Jamais me esquecerei. Foi ali, através de tanta emoção, que a pequena Thais, mesmo sem saber, fez brotar lá no fundo dos oito corações intrépidos um raro sentimento: a união."

"E com essas vivências eu felizmente percebo, a cada dia, que demonizar o nosso próprio medo é reprimir a coragem. Portanto, não tenhamos receio de sentir nada, ou tudo. Mesmo aquelas coisas que por conta da bagagem moral, insistimos em rotular como fraquezas."

"E finalmente, sob a lua mágica daquela noite, quando por um breve instante as lágrimas de pura felicidade da Renata tocaram lá no fundo do meu peito, percebi através daquele intrépido momento, doce e sensível, o quanto amamos o ciclismo e somos especiais uns para os outros..."

A descida foi cruel também, mas um alívio: muito frio, não sentíamos mais as mãos, “congeladas” nos freios, a pista molhada e perigosa, o breu. E pra mim a dor, claro. As descidas são cruéis com meu joelho. Mas era hora de superar a dor. Todo o finde foi pra mim um exercício de superação, sem dúvida. De conhecer e reconhecer meus próprios limites...

A cidade não chegava: parecia que quanto mais descíamos, mais as luzes de Terê se afastavam de nós!!! Mas uma hora começaram os sinais de "civilização": uma luzinha ali, um hotelzinho acolá, e bem depois chegamos. Fomos direto parar em uma padaria, beber algo quente e ingerir algo “comível”. Lá, fomos recebidos por uma meninota cativante, que ficou fascinada com as bikes, e com a bagunça. Assim como um casal simpaticíssimo, que ficou admiradíssimo com nossa aventura, e fez questão de nos abraçar e beijar mesmo estando todos molhados e fedendo!!!

Depois, nos dividimos: metade pro Hotel Teresópolis, metade pra casa do Felipe. Pra mim, ali, estava tudo acabado. Não teria condições de continuar, só me restava acordar e pegar um ônibus pro Rio. Dormimos (com fooooome) por que o cansaço era mais forte.

A noite foi difícil: mal conseguia me mexer, foi uma gemeção só, muita dor e fisgadas que me acordavam. Pesadelos de eu voltando sozinha e me despedindo do grupo, na rodoviária, vendo-os seguir viagem. A manhã veio com juntas enrijecidas, cansaço, foooooome, dor e frustração. Me preparei psicologicamente pra voltar.

Mas ao ver os companheiros se arrumando pra partir, tomei um decisão difícil, pois não queria penalizar o grupo nem comprometer a viagem deles: ia seguir viagem, coloquei os tensores, apertei bem a joelheira, tomei analgésicos, disfarcei a dificuldade pra andar e fui-me embora. Tava disposta a suportar a dor, já que eles me disseram que o trajeto até Friburgo seria bem menos puxado que o da véspera. Tava determinada. Só não chegaria se a perna caísse. E aí com a certeza de que iria CHEGAR, tudo foi tão mais fácil!!!

O sangue foi esquentando e a dor diminuindo, fiquei mais tranqüila, até por que o trajeto era alternado, entre subidas e descidas. E nas descidas me garanto: sou lenta pra subir, mas desço rápido e recupero o ritmo. Além disso, estava mais segura: havia completado coisa MUUUUUITO pior na véspera, subidinhas com descidas então, seria água com açúcar. E foi mesmo! Uma delicia o circuito Terê-Friburgo, paisagens arrebatadoras, plantações de ervas, uma coisa de louco! Cansaço? Nem dava pra sentir, o visual nos extasiava. A chuva deu uma trégua durante toda a manhã, pra voltar a tarde. Quando vi a placa Friburgo 3 km, as lágrimas vieram. Afinal, dever cumprido. Pra mim, uma grande vitória pessoal, num momento da minha vida que passei por situações e decisoes difíceis e desafiadoras.

Agora, esta semana, vou sossegar. Cuidar dos joelhos, fazer a ressonância, e descansar. Chega de estripulias. Por enquanto, é claro, até o próximo pedal do finde.

Um grupo maravilhoso. Só tenho a agradecer a todos: Denise, que teve a excelente idéia da viagem; Bob Pai, pelo bom humor e incentivo a todos; Emílio, pela amizade e companhia eternamente agradável; Roger, pelas dicas experientes do grande ciclista que é; Rê, pela animação e cumplicidade; Edison, pelas brincadeiras que acabam com qualquer mau humor e desfazem a tensão; Felipe, pela companhia de ex-morador ilustre da Serra; Carmelo, que vai ficar devendo nos acompanhar até o final na próxima aventura.

3 comentários:

  1. Ufa, rs! Vivi na imaginação, longe da agonia e da dor, mas vivi. Parabéns.

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  2. Mesmo lendo pela 6ª vez eu ainda me emociono...Lembrar e viver novamente!

    Bjos ciclisticos

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  3. Sua narração me cativou, emocionou, me estremeceu, por isso adoro você, querida Thais...este grupo foi super animador e o meu prazer ao ver aquelas crianças felizes, acho que fiquei mais feliz do que elas...Bjs.

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